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A gaúcha Dell Anno criou um modelo incomum de universidade corporativa, em que os alunos pagam para assistir às aulas – e só participa quem quer

Em dezembro, o paulista José Eduardo Schneider deixou seu escritório em Americana, no interior de São Paulo, e viajou para Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul. Um dos 80 franqueados da fabricante de móveis gaúcha Dell Anno, Schneider foi assistir às aulas finais de um curso promovido pela universidade corporativa criada pela empresa em maio do ano passado. Participar de um compromisso como esse é relativamente comum na vida de executivos — hoje existem pelo menos 120 universidades corporativas no Brasil. A experiência de Schneider, porém, tem uma particularidade: o custo das aulas foi bancado por ele mesmo — e não pela empresa, como normalmente acontece nessas instituições. Schneider e outros 13 franqueados da Dell Anno investiram 10 000 reais cada um nos três módulos do curso, que somaram 72 horas de aula. Feitas as contas, o preço por hora é 138 reais — cerca de quatro vezes o valor de um MBA numa escola renomada no Brasil, como a Fundação Instituto de Administração, da USP, e a Fundação Getulio Vargas. O custo é também semelhante ao de um curso na americana Harvard, pelo qual se paga o equivalente a 120 000 reais por cerca de 1 000 horas de aula na pós-graduação. “Paguei, como pagaria por uma boa pós-graduação”, diz Schneider, que possui duas lojas da marca no interior de São Paulo e já planeja a abertura de outras duas até o final deste ano. “A diferença é que esse curso é totalmente centrado no meu negócio.”

A universidade corporativa — que ganhou força a partir dos anos 80 nos Estados Unidos com a promessa de padronizar o conhecimento e acelerar a formação de profissionais dentro das empresas — em geral é vista como uma espécie de benefício recebido pelo funcionário, que aprende sem pagar nada por isso. O retorno viria na forma de profissionais mais preparados e competitivos. É assim em grandes empresas mundo afora, como no célebre centro de treinamento da General Electric, em Crotonville, nos Estados Unidos, em que funcionários de mais de 40 países são treinados todos os anos. O investimento da GE feito em Crotonville é de 1 bilhão de dólares anuais. “O modelo da universidade corporativa da Dell Anno é raro e polêmico. Mas o fato é que os alunos valorizam mais quando têm de bancar as aulas”, diz Marisa Pereira Eboli, professora da Universidade de São Paulo e especialista em universidades corporativas. Até criar a própria universidade, a empresa fazia apenas o que é comum aos fabricantes com sistema de franquias: treinamento gratuito de lojistas e gerentes de loja para ensinar padrões de venda e atendimento. Seus diretores, porém, alegam ter percebido que todo o investimento em treinamento ia pelo ralo com a alta rotatividade de funcionários nas lojas. De cada dez profissionais treinados, apenas três permaneciam na empresa nos 12 meses seguintes. “Decidimos oferecer um curso para o lojista aprender a escolher bem a equipe e tirar o melhor proveito dela”, diz Frank Zietolie, sócio e presidente do grupo Única, dono da marca Dell Anno. “O formato pago era a melhor maneira de fazer com que cada participante valorizasse o conhecimento adquirido.”

No começo, alguns franqueados estranharam a novidade. “Nunca tinha ouvido falar nesse modelo e não entendi por que teríamos de pagar”, afirma um deles. Para vencer a resistência inicial, a empresa partiu para um trabalho de convencimento. O executivo Marcelo Rossi, gerente de treinamento da Única, passou quase três meses em peregrinação pelo país para explicar o modelo aos lojistas antes do início da primeira turma. “Tivemos receio de não conseguir adesão, mas depois nos surpreendemos com a receptividade dos lojistas”, diz Rossi. A próxima turma, cujas aulas se iniciam em fevereiro, já está lotada com 16 participantes. A meta da empresa é que os donos de todas as 300 lojas da rede passem pela universidade — mas, como os cursos são pagos pelos franqueados, a inscrição é voluntária. “É claro que existe uma pressão informal para que os lojistas se inscrevam”, diz um franqueado que preferiu não se identificar. “Ficar de fora pega mal, sobretudo para quem tem alta rotatividade de funcionários e resultados ruins.”

Modelo diferente
Veja as características mais inusitadas da universidade da Dell Anno
1. O ALUNO PAGA
O custo do curso – 10 000 reais por aluno – é bancado pelos próprios participantes
2. PARTICIPA QUEM QUER
Por enquanto, 14 dos cerca de 80 franqueados participaram dos cursos. Mas já existe uma fila de 16 interessados
3. OS ALUNOS TAMBÉM ENSINAM
Os franqueados apresentam os próprios avanços para que os demais copiem as melhores idéias
Fontes: empresa e lojistas

O programa, desenvolvido pelo consultor paranaense Eduardo Ferraz, responsável pelos demais treinamentos da Dell Anno há uma década, é quase todo voltado para a operação. Nas salas de aula, os alunos aprendem a contratar funcionários e a aumentar a lucratividade das lojas, por exemplo. Além disso, aqueles cujas lojas apresentam melhor desempenho ensinam os colegas a melhorar as vendas. É o caso do programa de fidelidade para vendedores criado pelo pernambucano Dilamar Galanhol, dono de quatro lojas em Recife, que dá prêmios em dinheiro aos funcionários que cumprem suas metas de venda — a idéia (que não pode ser considerada exatamente uma inovação mundial) já foi adotada por outros dois franqueados. Alguns deles creditam melhorias nos resultados às técnicas ensinadas na universidade corporativa. É o caso de José Luis Rodrigues. Segundo o empresário, suas sete lojas, localizadas no Paraná, dobraram o faturamento desde maio, quando ele começou a fazer o curso. “O curso exige um investimento inicial, mas é uma fórmula em que os dois lados saem ganhando”, diz Rodrigues.

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