Insatisfeitos com o rumo de suas vidas profissionais, eles largaram as carreiras em que se formaram e atuaram por anos e começaram uma nova, do zero. Claudio deixou os estetoscópios e o trabalho nos bancos de coleta de sangue como biomédico para viver rodeado de escovas, tesouras e maquiagem – ele se tornou cabeleireiro. Marina largou o trabalho como repórter em um jornal para criar a própria empresa que vende arranjos de flores e os entrega em São Paulo, de bicicleta. Patricia deixou a carreira como advogada para criar uma empresa de profissionais que cuidam de idosos.

 

Em comum, as histórias despertam curiosidade, inspiração e comentários do gênero: “Que coragem!”. Porém, mais que coragem, Claudio, Marina e Patrícia estudaram, se planejaram e se conheceram mais até pôr em prática o ‘plano B’ para suas vidas profissionais.

“Depois de 18 anos trabalhando em hospitais, entrei no piloto automático e queria sentir um frio na barriga de novo, algo que me desse uma revigorada”, diz Claudio Taccetti Filho, de 55 anos, biomédico, atualmente proprietário de um salão de beleza em São Paulo onde atua como cabeleireiro e maquiador.

Tacetti Filho trabalhou em bancos de sangue de hospitais de primeira linha em São Paulo, mas sempre gostou da área da beleza. Quando concluiu o ensino médio, e chegou o momento de prestar vestibular, no entanto, ele nem cogitou estudar algo no segmento da beleza. “Também gostava da área da saúde, e imaginei que, se tivesse um nível universitário, poderia me posicionar melhor. Não me arrependo, mas todo mundo tem outras aptidões.”

Após uma demissão, Tacetti Filho cogitou mudar de área, pensou na afinidade que sempre teve com arrumar cabelos de mulheres, amadureceu a ideia e se matriculou em um curso de um ano e meio. Neste período, se dedicou às aulas e não trabalhou.

Em 2010, antes mesmo de concluir o curso, foi convidado por uma amiga que tinha adquirido um salão a trabalhar com ela, como cabeleireiro. Outra mudança veio em meados do ano passado, em julho, quando sua amiga resolveu se desfazer do salão e Tacetti Filho assumiu o gerenciamento do negócio. Agora concilia as funções de administrador com as de cabeleireiro e maquiador.

“Foram duas grandes mudanças na vida. A primeira da profissão e, agora, passei a ter meu próprio negócio. Uma coisa era o que fazia antes, ajudava a gerenciar, outra é pensar se o dinheiro que entra vai ser suficiente para cobrir os gastos no fim do mês. Dá um frio na barriga, mas é bom.”

No primeiro mês como cabeleireiro, recebeu R$ 400 como salário. Menos de seis meses depois conseguiu recuperar o que recebia no hospital. Hoje seu faturamento é maior, porém ele dedica mais tempo ao trabalho que antes.  “Agora tenho outra vida, tenho horário flexível, desde que comecei não consegui tirar férias, mas ainda sinto uma euforia de um trabalho que deu certo. Ganho dinheiro e me divirto.”

Para o cabeleireiro, uma guinada radical na vida profissional exige persistência, autoconhecimento para descobrir uma nova vocação, e planejamento financeiro. “Também precisa ter coragem e ser um pouquinho louco. Se você pensar em tudo não faz, tem de encarar as consequências, retroceder um pouco para crescer, e a nossa tendência é ficar na zona de conforto.”

‘Fada das flores’
Marina Gurgel Prado, de 27 anos, já gostava de flores e de pedalar, mas ganhava dinheiro com jornalismo desde 2007. Em dezembro de 2012, pediu a conta do jornal em que trabalhava como repórter, mesmo sem saber ao certo que rumo daria para a vida. “Não estava feliz na profissão e se continuasse acomodada não ia resolver nada. A perspectiva de ganhar bem continuava remota e ser sustentada pelo marido não era um plano na minha vida. Vi as pessoas na mesma situação. Os chefes com carreiras sólidas eram demitidos, não era isso que eu queria”, diz.

O rumo não demorou muito para vir. Marina conheceu a futura sócia, Tatiana Pascowitch, e juntas elas criaram, em abril, a empresa chamada “A Bela do Dia.” De bicicletas, elas entregam arranjos de flores em casas e estabelecimentos comerciais de São Paulo. Em três bikes, são cerca de 30 entregas por dia.

Marina faz os arranjos de manhã, depois sai para pedalar para entregá-los e também cuida da administração do negócio. Mais do que isso: está feliz da vida. “Queria algo que me desse mais retorno. Eu amo escrever, mas sentia falta de fazer outras coisas. Ficar sentada o dia todo em frente ao computador não me agradava.”

A empresa já se sustenta e Marina e a sócia passaram a receber salários há três meses. “A satisfação é muito grande, dá trabalho, mas é bem prazeroso trabalhar com o que gosto. Encontro gente feliz, outro dia fui fazer uma entrega em um batizado e um menino me chamou de ‘fada das flores’, não trabalho com gente mal humorada. Valeu a pena.”

Para quem quer mudar de vida, a dica de Marina é primeiro entender que é possível ter mais de uma habilidade, também é preciso planejamento financeiro e uma dose de coragem. “Somos criados a achar que só sabemos fazer uma coisa, e é difícil perceber que não, dá medo. Também tem de existir planejamento financeiro para não entrar em pânico. No meu caso, tinha dinheiro guardado, não tenho filhos, então não foi completamente irresponsável. Se eu estou feliz? Não tenho a menor dúvida.”

Advogada, psicóloga e empresária
Patricia Lerner Sereno, de 38 anos, foi para a faculdade de direito logo quando terminou o ensino médio. Após trabalhar em escritórios de advocacia, fez a sua primeira mudança na carreira em 2001, quando teve seu primeiro filho e fez um curso de acompanhamento terapêutico. Em 2004, ela começou a faculdade de psicologia.

“Não estava satisfeita com a minha carreira e não achava certo deixar os filhos em casa para fazer algo que não gostava. Mas também não queria ficar em casa.”

Com a nova formação, ela começou a trabalhar em hospitais e fazer atendimento em domicílio, quando percebeu que muitas famílias ficavam fragilizadas com a doença de um parente e tinham dificuldades para lidar com a situação, e também com os profissionais de saúde e cuidadores. “Passei a enxergar uma demanda muito grande no mercado”, lembra. A função da empresa de Patricia é oferecer um profissional ou cuidador adequado às necessidades do paciente e mediar essa relação.

O planejamento da empresa começou em 2010 e saiu do papel em 2011 quando ela encontrou sua sócia, Martha Stein, que também deixou sua carreira, mas na área de marketing.

Para a empresária, a principal dica para quem quer mudar de carreira é fazer o que gosta. Ela também lembra da importância de analisar o mercado para apresentar um diferencial e ter sucesso.

Segundo Patricia, elas não fizeram um grande investimento inicial, já que trabalhavam em casa e só se encontravam para discutir casos complexos. A empresa se desenvolveu por meio de publicidade em redes sociais e pela propaganda “boca a boca”. Depois de três meses, as empresárias já começaram a ver os resultados e, há um ano, abriram o escritório.

“Tenho certeza que acertei na minha escolha. Estou feliz com o meu trabalho, pois consigo tanto ajudar as pessoas que estão passando por uma fase complicada, e também as cuidadoras, que passaram a ter um emprego que gostam e para qual se prepararam, podendo ter uma melhor qualidade de vida”, afirma.

Como mudar
Antes de decidir se o início de um novo ano é o melhor momento para trocar ou não de emprego ou de investir no próprio negócio, os profissionais precisam analisar sua carreira para saber se eles estão apenas cansados do trabalho ou se realmente precisam de uma mudança radical.

Reflexão sobre a carreira, planejamento, análise de mercado e até uma poupança para ‘vacas magras’ são ações imprescindíveis para quem está pensando em mudar sua vida profissional.

“Se a pessoa está em um lugar bom, ela aguenta o cansaço, sai de férias e volta com a pilha nova. Mas, se está esgotada, em uma situação ruim, é comum que ela comece a pensar seriamente em procurar outro emprego”, afirma o consultor em gestão de pessoas Eduardo Ferraz.

Segundo Ferraz, é importante pensar na situação financeira, mas também é preciso levar em conta quais são as chances de segurança e estabilidade, aprendizado e promoção. “Pese essas quatro coisas, se três delas são favoráveis, mude”, recomenda.

Nesta época do ano também é comum a ação por impulso, já que muitas pessoas querem começar o ano com o “pé direito”, por isso usar os dias de folga para refletir e fazer um planejamento é uma boa saída.

“Sempre é tempo de recomeçar, mas com prudência e planejamento. É preciso estudar uma nova opção por, no mínimo, três meses antes de tomar a decisão de mudar algo drástico na carreira”, completa o consultor.

http://g1.globo.com/concursos-e-emprego/noticia/2014/01/profissionais-que-largaram-carreiras-contam-como-deram-guinada-na-vida.html

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